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"Fio": a luz do sol também é um tipo de alimento – poesia

Seis poemas e uma prosa poética




esses poemas

sãos

paraqueles que

dizem nada cai

do céu

porque não

sabem que a luz

do sol

também é um tipo

de alimento




pécora: quenga, rameira, messalina, vulgívaga, piranha, zabaneira vulgívaga, minha dúvida dardeja a dádiva de nosso sexo pécora em uma película peniana tão profana tão erétil tão errática que o projétil da solidão ataca frágeis corpos caninos e corações calosos de engano em engano sinfonia sintonia sincronia sinastria sinergia sinestesia cancro mole mania púberes, bárbaros, indago o amor é casto? o amor existe? o amor insiste? o amor é pacto? tomar jeito se tomar jeito tiver tanta graça quanto tomar cachaça



domingo chuvoso

o ar é cinza

o movimento é pardo

o bocejo enlanguesce

as pernas da cidade



a cabeça

minha dor dorme

minha dor dor dorme

parangolé, caxambu

paranauê, maracatu

minha dor dorme

minha dor dor dorme

murilograma, mefistofélico,

babilaque, amalgâmica

minha dor dorme

minha dor dor dorme

reage no engasgue do medo

não traja o engano do sol

no gozo reconhece deus

no amor, you don’t know me at all

minha dor dorme

minha dor dor dorme

besouro sobre a trança de fios grisalhos

flor e náusea do meu cangalho.


o que é carne, lembra; o que não é, lenda


quando rolarem as pitangas

coma as pitangas

sem morder a língua


é fato não compreender

mesmo o que refrata sincero

se roer até o osso

cuando cuspir o caroço vai ver

o que não nasce resta oco

e o que nasce é sempre torto

atristam e constipam pitangas de plástico

fugir é deixar essas pelo asfalto



ele passa o dia com as mãos nas costas ouvindo os motores assistindo às sacolas, bolsas e mochilas assentindo com sorrisos e isso é tudo eles ficam sentados à espera da chamada, vestidos de preto, parados, indo e vindo com pressa comendo cachorro-quente e rindo e isso é tudo eles ficam em seus carros vermelhos, dormindo, ouvindo notícia, música, conversando partindo e chegando e isso é tudo eu passo os dias sentada, lendo, reclamando, tomando café, conversando, chorando fazendo a linha e apagando e isso é tudo quando chove, a rua molha quando faz sol, esquenta quando saio de casa, volto tomo o banho, faço xixi, cocô

assôo o nariz assovio assopro durmo acordo esqueço cumpro um dia não sinto nada outro dia sinto mágoas outro dia só desconforto

sinto coceira, cozinho,

vou vê-los da sacada, ninguém chega

todas saem

domingo de sol não é nada

sexta-feira nem vejo

sábado lamento

corações se partem, se encontram

se comem

todas chegam, outros chegam,

entram e saem, bicicletas pra cima

bicicletas pra baixo, o gato foge,

o gato volta, o gato não volta,

o vizinho reclama das gargalhadas, da música e das marcas de pneu na parede

acaba o tabaco, acaba a colomy,

acaba o dinheiro, acaba a esperança

assim como acaba a poesia

e a carne moída do almoço

se transforma em paisagem refletida







Taquígrafa taquifilática


o mentiroso. naquele momento em que simone de beauvoir explica que ela revela-se quando escreve, ele se esconde. na aparente entrega, códigos sobre códigos, inconfissões, rotas que parecem sinuosas e parece que ela vai puxar o carro, mas é ele que está bêbado. estereoscópio. O GRANDE UMBIGO DELES. UUUUUUUUUUUUMMMMMMMMbigoo silêncio perigoso da verdade (não sou eu que estou dizendo isso), a música para dança da loucura, sabotagem, uh! na rota de cima, ele vem ao meu encontro e sou um fantasma vampírico à porta da rocha, e ele (ele ali fora) não tem medo. o perigo mora em mim: sadomasoquismo, assassinato, o marido comendo fezes, suicídio de explosão, bum! lâmina e língua, sede fria: as palavras que não eram pra mim. fria, taquígrafa. passo por passo. o mentiroso. quero fazer o contrário. vou brincar de você me encontrar sem que precise me esconder; respondo: tudo bem. não converso com o passado. eu não

me refiro

ao passado

e sim ao mentiroso que vi no estereoscópio nesta noite (um homem sentado analisa seriamente). séria e perigosa. egoísmo sentado no cactus de flor cor-de-rosa murcha. seja esperta, seja mais esperta, ouça. ruídos da nave barbarela, pi pi piiiiiiiiiiii, ruidinhos. rawr, tiger, o mentiroso. tiger t-rex no meu chuveiro, será? e ainda ousei repetir: mas ele nunca me fez mal. singular, diziam. alguma coisa está muito errada, o encanto quebrou-se, ele não se importa, nem minimamente, ele nunca se importou e eu me menosprezei erroneamente. meu sussurro. meus olhos. o mentiroso que vejo é o mentiroso em mim, aaaah não! mas ele mente e é difícil saber. humanos, humanos. ato falho. os meus fatos. mas eu não entendi, então siga trabalhando, siga lendo slogans. depois faça slogans e cobre por eles. escritor em crise de autenticidade dando entrevista (eu na mesa na mesma olhando alguém falar) (a pessoa com uma rúcula no canto da boca escorada sobre os cotovelos sobre a mesa do restaurante ao meio-dia vendo as notícias parece ruminante). retorno. seu queixo, aponta a senhorinha, no seu queixo, mais pra cá. saiu. insira dúvidas, acredite na sensação e faça algo com isso. não faça algo contra alguém. quanto tempo de lucidez? bateu a vergonha, iludido é quem se ilude, ai, aqueles tolos aeromodelos. alguém depois aperfeiçoa o brinquedo, parecia brinquedo, era arquétipo. aliás, aeromodelo. ai, búzios, dama de espada, enfim o seu negativo erigido à musica concreta. piiiiiiiiiiiii, rawr, vampírica taquígrafa pólen de rocha queimada

mel petroquímico

( — )


_

Caren Ane Rhoden (1990) é jornalista, estuda Letras, escreve e faz pães na PANK! fermentados. Fez parte da revista O Viés (2009-2015) e publicou seu primeiro livro de poemas, Deserto de Sal, em 2014, pela Maria Papelão Cartonera, de Santa Maria/RS. Em 2019, lançou Fio, pela Diadorim Editora, de Porto Alegre.

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